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terça-feira, 24 de novembro de 2020

Métrica

O economista adora opinar sobre assuntos de diversas áreas como saúde, educação, violência e discriminação. Grande parte se deve a nossa curiosidade, porém o fundamental da intervenção do economista deveria ser a sua "caixa de ferramentas" para medição de impactos sociais.

Uma das definições de métrica é "o conjunto de regras que presidem a medida". A origem da palavra está relacionada ao rigor para a versificação de um poema.  Coincidência ou não, uma das maiores revistas de Economia do mundo (reconhecida pela exigência de grande rigor matemático) se chama Econométrica.

As ferramentas que usamos para medir impactos sociais nos permitem abordar questões de grande impacto para a sociedade, a exemplo de "como barreiras de entrada e discriminação à mulheres e negros no mercado de trabalho impactam o crescimento de um país?".

Esta pergunta foi abordada por pesquisadores da Universidade de Chicago e Stanford em artigo publicado na Econométrica. 

O texto menciona o exemplo da primeira Juíza da Suprema Corte Norte Americana, Sandra Day O'Connor, que apesar de ser uma das 3 melhores alunas da Escola de Direito de Stanford, após sua formatura em 1952, recebeu apenas uma proposta para ser Secretária.

Nesse sentido, não é preciso muito cálculo para avaliar que Sandra O'Connor era muito mais qualificada que vários colegas os quais receberam propostas de grandes escritórios. Nesses casos é importante destacar que a sociedade como um todo perde quando pessoas com talento não recebem oportunidades compatíveis com sua formação ("misallocation").

Utilizando ferramentas econométricas, os autores procuram avaliar dois fenômenos: (i) as barreiras de entrada para mulheres e negros ingressarem no mercado de trabalho e (ii) a discriminação que eles sofrem já empregados.

Parte da estratégia é baseada na mudança da composição racial e de gênero observada em algumas profissões nos últimos anos. Nos EUA em 1960, 94% dos médicos eram homens brancos enquanto em 2010 este percentual chegou a 62%.

O gráfico abaixo mostra a evolução das barreiras de entrada às mulheres. Valores maiores que 1 apresentam dificuldade para ingressar numa determinada profissão. Repare que na área de Construção Civil as mulheres ainda encontram uma grande barreira porém entre Médicos e Advogados houve uma queda significativa ao longo dos anos.

Barreiras de entrada nesse caso podem ser compreendidas como fatores que desestimulam um indíviduo a escolher uma determinada profissão. Isto pode se manifestar por diversos mecanismos como falta de apoio familiar ou ausência de exemplos de pessoas do mesmo gênero ou raça numa determinada carreira.

Já a discriminação nesse contexto ocorre após o indivíduo escolher uma determinada carreira. Nesse sentido é comum ouvirmos casos de pessoas bem qualificadas com dificuldade de ingressar em determinadas empresas ou mesmo após selecionadas não conseguirem ascender a cargos de destaque e liderança.

Sandra O'Connor provavelmente sentiu os dois efeitos, tanto na década de 60 era muito raro haver mulheres cursando Direito como após formada era ainda mais difícil encontrar Advogadas nos grandes escritórios dos EUA. 

Por fim o artigo estima quanto a sociedade norte americana ganhou com a inclusão de mulheres e negros em profissões dominadas anteriormente por homens brancos. Para isto os autores simulam como seria a riqueza per capita caso se mantivesse o mesmo cenário de 1960, e a comparam com o que ocorreu na realidade.

No gráfico abaixo a linha verde (inferior) indica como seria o pib per capita dos EUA se a estrutura de gênero e raça dos anos 60 fosse mantida. O diferencial estimado com a inclusão foi de cerca de 40% , observado pela linha azul (superior).

Claro que há ressalvas por se tratar de uma simulação, porém é importante trazer evidências como esta para o debate público e avaliação de medidas para maior inclusão no mercado de trabalho.

Sandra O'Connor nomeada para a Suprema Corte em 1981 com certeza influenciou Ruth Ginsburg (1993), Sonia Sotomayor (2009), Elena Kagan (2010) e Amy Coney Barret (2020) na trajetória para o cargo de juízas. 

Há ainda muita margem para melhora no mercado de trabalho, mas é importante reforçar esta trajetória das últimas décadas com exemplos e evidências de que um mercado de trabalho com maior diversidade pode de fato trazer ganhos para toda a sociedade. 



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