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quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Tribalivre

"Um dia, minha mãe me disse, você já é grande, tem que trabalhar! Naquele instante aproveitei a chance, vi que eu era livre para me virar!"

"O tempo passou depressa, e eu aqui cheguei, passei por tudo que é dificuldade, me perdi pela cidade, mas já me encontrei!"

Uma série de motivos fizeram eu consolidar minha vida na cidade de São Paulo. Um fato interessante é notar o número de famílias são originalmente de outras cidades, estados e países. Dito de outro forma, no meu convívio, é difícil encontrar uma família paulistana "raiz", na qual os avós e bisavós nasceram aqui na capital.

Minha ascendência é uma grande mistura entre a cultura baiana, árabe e espanhola, personagens de povos que por diferentes razões escolheram a cidade de São Paulo para residir, estudar, trabalhar e constituir família.

Houve um tempo em que tive pouco apreço por esta cidade, o trânsito caótico e o grande número de moradores de rua eram dois fatores que me causavam tristeza e me impediam de valorizar as oportunidades que São Paulo oferece.

A maior delas sem dúvida está ligada ao retorno e impacto da educação na vida das pessoas. No meu caso, hoje é muito fácil ver que o padrão de vida que desfruto é uma consequência direta das oportunidades profissionais que surgiram pelo acesso que tive à um ensino de qualidade, em especial uma graduação 100% gratuita custeada pelo Estado de São Paulo.

História semelhante ocorreu com diversos amigos de faculdade, os quais ascenderam à posições profissionais de destaque e hoje estão muito bem. Apesar de vários cases de sucesso, ainda hoje vivemos numa sociedade extremamente desigual, na qual a renda é extremamente concentrada.

O estudo Mapa da Desigualdade publicado pela Nossa São Paulo revela alguns indicadores alarmantes em diversas áreas como saúde, educação, criminalidade e renda na cidade de São Paulo. 

Um dado que me chamou bastante atenção é sobre a concentração imobiliária, 22.400 pessoas (1% do total de proprietários de imóveis) detém 25% dos imóveis registrados na cidade os quais somam R$ 749 bilhões. Isso equivale dizer que na média cada membro deste pequeno grupo possui um total de imóveis avaliados em cerca de R$ 34 milhões.

Outro dado importante, que abrange o país como um todo e não somente São Paulo, é o de renda domiciliar per capita. Os dados da PNAD mostram que 60% das pessoas vive com renda per capita de até R$ 792,00 por mês.

Algumas conclusões para mim são bem evidentes, a primeira é que, por conviver com pessoas de formação educacional semelhante, muitas vezes achamos que estamos na média da população em termos financeiros. Este ponto cai por terra quando notamos que os 10% mais ricos do Brasil possuem rendimento domiciliar per capita de em média R$ 4.510,00. 

Não é preciso ir muito longe ou fazer uma ampla pesquisa para encontrar alguém em São Paulo que resida num domicílio com renda per capita superior à este montante. Se você está ou conhece alguém nessa faixa de renda, pode até parecer curioso, mas você ou este conhecido estão entre os 10% mais ricos do país.

Quando você percebe que é um privilegiado num país no qual tantas pessoas passam dificuldades, e que muitas delas ainda hoje não possuem acesso a serviços básicos como saúde e educação de qualidade, sua relação com a sociedade muda.

Há milhares de causas meritórias e que devem sim ser motivo de luta como a defesa do meio ambiente e dos animais, mas na minha opinião nada é mais importante que reduzir a desigualdade e promover ações que tentem melhorar a vida de outros seres humanos.

Alguns podem até me criticar, mas acho curioso o crescente número de pessoas que vocifera contra restaurantes que utilizam canudos de plástico, repudia maus tratos aos animais porém não "move uma palha" para alguma medida de auxílio ao próximo, seja ela via voluntariado ou apoiando causas que ajudem a reduzir o abismo entre pobres e ricos, em especial em São Paulo. 

Pode ser um pensamento utópico de quem aqui vos escreve, mas eu ainda vislumbro um dia que nas redes sociais veremos menos fotos de animais fofos, restaurantes caros e festas exclusivas e mais ações sociais que ajudem no combate à pobreza e auxiliem no acesso à saúde e educação dos habitantes desta cidade.  

*Os trechos iniciais do texto são da música Tribalivre da Banda Tribalistas.




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