Um dos argumentos mais comuns no repertório da desonestidade intelectual é levantar estatísticas que contribuem para seu ponto de vista e omitir aquelas que não lhe convém.
Este tipo de comportamento lembra muito o Efeito Halo , o qual resumidamente fala que as primeiras impresões contam (e muito) e criam um viés que interfere a capacidade de julgamento das pesssoas.
Imagine que você no seu ambiente de trabalho ou de estudos tenha uma experiência desagradável com algum colega logo no primeiro contato. Suponha que por exemplo você testemunhou a pessoa falando mal de outros colegas ou reparou que ela fica constantemente em redes sociais ao invés de se dedicar à suas atividades ou mesmo viu esta pessoa "furando fila". Neste caso muitas pessoas teriam dificuldade de avaliar de forma imparcial estes indivíduos, por mais que nos dias posteriores a pessoa tenha mostrado outras qualidades ou mesmo que aqueles traços de má conduta tenham sumido, é difícil acreditar que a sua primeira impressão possa estar tão errada.
Quando falamos de Economia, por mais forte que sejam nossas convicções e vieses, há sempre algo que qualquer profissional sério pode fazer para obter uma avaliação imparcial, utilizar ferramentas estatísticas que validem sua hipótese de forma robusta e a diferencie de um mero chute ou opinião de buteco.
Pois bem, quando a Reforma Trabalhista do atual Governo foi implementada, partidos políticos caracterizados como de esquerda e mesmo o folclórico Eduardo Suplicy (que fica aqui o registro foi professor titular de Economia da EESP-FGV por décadas) saíram correndo para alardear sobre as mazelas da medida que reduziu empregos após implementada.
Curiosamente (ou não), essas mesmas pessoas não vieram se pronunciar publicamente sobre os 195 mil empregos criados no período de janeiro a março de 2018 conforme divulgado pelo CAGED na semana passada (série sem ajuste sazonal).
Será que os opositores da Reforma Trabalhista acham este número muito baixo? Ou simplesmente é muito mais fácil e conveniente usar um dado apenas quando ele favorece sua causa?
Parece muito claro para este escriba que trata-se da segunda alternativa. Nem vou ser tão rigoroso e falar de ajuste sazonal ou testes de causalidade porém, partindo da premissa que a reforma trabalhista foi devastadora e iniciou um processo de destruição de empregos formais em dezembro, vamos ver se esta geração de postos de trabalho do CAGED é apenas um brilhareco, comparando a geração de emprego no período de janeiro a março dos úlitmos 5 anos:
Empregos Formais Criados (CAGED) | |
Ano | jan-mar |
2014 | 303,535 |
2015 | -64,907 |
2016 | -323,052 |
2017 | -68,876 |
2018 | 195,861 |
Nessa análise trivial, sem qualquer ajuste, vemos que o primeiro trimestre de 2018 foi o melhor desde 2014, um dado em linha com o sentimento de que o pior da crise já passou. Porém, esta tabela tosca é o suficiente para falar que a reforma trabalhista foi um sucesso? De forma similar podemos dizer que graças à reforma trabalhista foram gerados quase 200 mil empregos?
Obviamente não, pelo menos se você for um economista sério com o mínimo de zelo pela estatística.
A principal mensagem do post de hoje é que, num mundo no qual a informação flui tão rápido e o presidente da maior nação do globo faz pronunciamentos via tweets, precisamos ter muito cuidado e atenção para extrair o viés de uma reportagem e não cair na famigerada fake news.
É chato pensar que a partir de agora será necessário desconfiar de tudo o que você lê em jornais e redes sociais mas acreditem, com tanta picaretagem por aí afora você se torna calejado rapidamente na arte de desmascarar pessoas que divulgam apenas verdades convenientes ao seu ponto de vista.
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